quarta-feira, 30 de maio de 2012

Poslúdio - Um Brinde a Jesus



Hoje acordei com vontade danada de ver o mar.

Ontem não fui à Praia. Não quis. Havia um mar em mim e eu necessitava bebê-lo.

Hoje quero beber junto ao mar, na ponta da praia, no filete de rocha moída. Vou beber feito bebê com a boca no bico dos seios de sua mamãe e feito macho dando tapa na bunda fêmea de sua amada na beirada da cama. Não vou me embebedar. Não vou tomar um porre. Embebedar-me-ei de domínio-próprio para minha loucura ficar lúcida.

Elegantemente vou brindar a alguém em especial.

_ Arlindo, uma dose boa de Rum, bebida de pirata, e uma Coca-cola de lata, por favor!

_ Cuba-livre! Lembrou-me educadamente o garçom.

Eu gosto de saber os ingredientes da mistura que eu mesmo faço questão de preparar. Minhas doses são diferenciadas. Desprezo uma receita. O que é doce pra alguém, pra mim pode ser extremamente doce. Meus olhos nasceram com zoom. Até batizaria com outro nome:

_ Garçom, um “Hombre Libre”, por favor!

Homem Livre! É de bom tom.

Falando em som, por que brindamos? Por que será que damos voz às taças, aos copos, aos bicos de garrafa e até às latas?

Há num hábito todo um sentido que sempre é perdido, esquecido na gaveta gasta da rotina. Transforma-se em proforma.

Mero manual de etiqueta

De um patrão faz-se empregado

Que nem recebe gorjeta



Amigo, se vais gozar a vida, goze-a até perceber que um orgasmo é morte. É esgotamento de quem foi pleno na vida.

Um corpo sedento quer uma bebida e faz cinco sentidos seu desejo de brindá-lo a quem ele julga ser especial no estalar do toque metálico.

1º Os olhos atravessam a taça em seu vestido transparente, desejando sorver a carne líquida e morena que dança num palco cintilante de gelos. Ver aquela transpiração faz salivar a boca que engole saliva e a dança da silhueta mulata é de deixar qualquer um tonto;

2º As mãos tateiam com seus dedos quentes a pele vítrea e gelada como se fora a pele da morena que saíra de um banho frio, respingada de pingos e veios iluminados de ouro, aguardando as costas largas e nuas as mãos do tecido atoalhado, seco, quente e macio. E há ainda o peso, a densidade, o líquido, o sólido, o quente, o frio, o duro e o tenro.

3º Taça às narinas é fatal! Meu nariz é focinho de lobo bandeirante que desbrava a floresta densa, a mata ciliar, em busca do precioso líquido que dessedenta a sede. À distância sente o cheiro ardente. O hálito febril da bebida me é torpor alcoólico só de cheirá-la. Eu fico doente feito o cão que sentiu o cheiro de cio da cadela que dele fugiu! Cheiro é resgate de infância. É lembrança ingênua da liberdade de ser e ser feliz!

4º A língua atoalhada de papilas gustativas, primeiro, engole seco a saliva onomatopeica (glupt!). Permite-se encharcar dos poros trans-pirantes.

O gosto aveludado e amargo do Rum

tira pra dançar a mulata Coca-Cola faceira,

doce, ácida, fervilhante.

Executam Samba de Gafieira

Num passo de dança

Decoram um salão com um palato

De cabeça pra baixo no teto

Pra dançar têm tato

E viram minha cabeça

Invejosos gélidos

Sambam tímidos no copo

Da boca meio distante

E disse João:
_ Amado mestre, já enchemos os oito tonéis
de água, como o Senhor nos ordenou!
E disse Jesus:
_ Amado João, em verdade te digo que estarás 
comigo no paraíso!


5º A bebida é feitiço. Um homem, a quem julgo ser o homem mais sedutor que pisou o nosso chão, fez magia, feitiçaria, milagre. Água em vinho transformou. O sujeito com verbo historificado no tempo era um fanfarrão. Gostava de gente, festa e alegria. Impossível um homem trazer boas-novas e não ser feliz.

Nós, pobres mortais, não sabemos fazer milagre. Criamos, então, símbolos. Fantasiamos uma taça de vinho que fala. A ela damos uma voz. Não se pode distrair com o som balbuciante de gelinhos-criança presos, esperneando no berço do copo. É preciso amadurecer, ter uma voz própria que deixa no mundo a sua digital. E essa voz nasce da partilha, do compartilhar da mesa e dos copos, do beijo de uma taça que beija outra taça, do toque no ombro amigo, da tentativa de ser abrigo. A voz que nasce do encontro. E quando duas taças cheias se encontram, elas se erguem aos Céus em gratidão a Deus, se olham nos olhos, sorriem alegremente e:

_ Tim-Tim!

A santa trindade humana, composta por Estribo, Bigorna e Martelo, recebendo as vibrações arquitetônicas de tímpanos tocados pela orquestra magistral de taças, enfiam ondas de alegria adentro da alma pelo corpo afora. A epiderme se transforma numa passarela e os pelos se arrepiam, dançando um Carnaval que arrepia os pelos da pele de Deus!

_Tim-Tim! Um brinde a Jesus!



6º Aí, meu caro! Só você bebendo pra descobrir seu sexto-sentido!





P.S.: Quer saber o que penso - de um ponto de vista, digamos, teológico - sobre a razão de o Estribo ser o menor osso do corpo humano?

Leia comigo o livro O UMBIGO DE ADÃO, uma cicatriz de dor e prazer da existência. Júlio Diniz, autor