Meu coração está latejando de dor esses dias.
Resolvi procurar o Médico dos médicos.
Muito simpático. Muito mesmo!
Recebeu-me com um abraço caloroso e um sorriso largo.
Ele cheirava a pão quentinho que acabara de sair do forno.
Que sujeito estranho! Muito mesmo!
Não mediu pressão
Não pediu exames
Nem tinha estetoscópio
Pediu-me para deitar no leito
Que leito estranho!
Era de madeira e tinha forma cruz
Tinha uns entalhes bem bacanas
Umas gravuras psicodélicas
Coisa de artista mesmo!
Eu: _ Ali?
Ele: _ Sim, senhor! A não ser que você queira deitar no chão ou sentar no meu colo!
E deu uma bela gargalhada.
Não resisti e rachei o bico.
Ele: _ Sou escultor nas horas vagas.
Eu: _ Hum! Entendi.
Senti-me mais confortável e confiante.
A segurança que o Homem transmitia era sedutora demais.
Deitei sobre a cruz, digo, o leito.
Ele então curvou o tronco e reclinou a cabeça em meu peito,
Encaixando o ouvido um pouco mais para o lado esquerdo.
E ficou ali por um bom tempo.
Levantou-se e vi lágrimas em seus olhos
Assustado, levantei-me rápido e sentei-me sobre a cruz
_ É grave, doutor?
_ Calma, rapaz! Não terminei. Deite-se aí de novo.
Colocou a mão sobre meu peito, fechou os olhos e apenas mexia os lábios mudos. E ficou assim por um bom tempo.
Abriu os olhos, mandou-me vestir a camisa.
_ Éh, rapaz! Você tem coração!
_ E a dor, doutor?!
Ele repetiu: Você tem coração.
Sentou-se à mesa e começou a escrever.
Virou-se para o armário, retirou umas amostras grátis, colocou junto com a folha num envelope e entregou-me.
_ Obrigado, doutor! Alguma restrição?
_ Você sabe. Disse ele, piscando o olho esquerdo e sorrindo.
Levantou-se e, com a mão em meu ombro, encaminhou-me até à porta.
Agradeci novamente e ele perguntou-me:
_ Não tá esquecendo-se de nada?
Como a dúvida pairava em meu rosto, ele disse:
_ Vem cá, rapaz! Dá outro abraço aqui. E coçou minha cabeça.
Atravessei o corredor vazio e escuro do hospital. Parei na escadaria, abri o envelope, retirei primeiro a folha. Não entendi nada daquele garrancho de letra. Retirei uma das caixinhas de remédio.
Em destaque uma sigla: C.T.I.S.
_ Mel Dels! Que merda é essa?
Logo abaixo, em letras minúsculas:
Com o Tempo Isso Sai
Desci a escada cantarolando:
“Eu apenas queria que você soubesse
Que aquela alegria ainda está comigo
E que a minha ternura não ficou na estrada
Não ficou tempo presa na poeira..."